Sabe como costumam dizer que é importante para crianças ter contato com os animais? A minha versão aos 5 anos é completamente contrária a essa história.
Eu não sabia escrever meu nome, mas meus pais decidiram que eu poderia escolher como chamaríamos o primeiro mascote da família, e no ápice da minha criatividade escolhi o nome do único cachorro que já conhecia, “Lassie”.
Ela não tinha absolutamente nada a ver a famosa Lassie do programa de televisão, era uma SRD com os pelos tão escuros quanto a noite e com a mordida tão dolorosa quanto pequenas facadas.
Honestamente não entendi nada quando ela chegou, apesar de ser um filhote eu a considerava enorme naquela época. E como um filhote reconhecendo o outro ela me mostrou que queria brincar e sua superioridade nisso.
No mesmo dia, conheci a força da sua mordida e passei horas em cima de uma cadeira — que ela não alcançava — apenas a observando, numa disputa de quem era mais curiosa, que ela ganhou, após me morder durante todo o caminho do portão até a porta de casa.
A odiei por medo, corria pelo quintal e subia no portão para fugir de suas brincadeiras dolorosas. Meus pais? Eles me deixavam lá, com o meu predador, para eu me acostumar.
E realmente me acostumei! Em menos de um mês foi a minha vez de a reconhecer como um filhote, sentava no chão ao seu lado e contava histórias para dormir, assim como gostava que contassem para mim.
Como filha única, a Lassie foi minha primeira verdadeira e leal companhia, conforme mudávamos de casa, era com ela que eu explorava os novos terrenos e graças a ela eu não tinha medo da imensidão do mundo, afinal, se ela — o filhote — tinha coragem, por que eu seria diferente?
Minha memória é estupidamente falha, mas eu lembro perfeitamente de um dos piores dias da minha infância, quando voltei para casa e a vi desfalecida no chão; eu não entendia.
Aquele foi meu primeiro contato com a morte, e ela, a Lassie, foi o meu primeiro encontro com o amor.
Claro que com os passar dos anos tive outras companhias, mas aquele filhote, que foi filhote comigo, e que se foi, antes de alcançar a maioridade, é a marca do final da minha primeira infância, foi minha primeira perda, dor e através dela aprendi o significado de saudade.